quarta-feira, 5 de outubro de 2011

CLARA NUNES-TRIBUTO AOS ORIXÁS AO VIVO

O PREÇO DA INGENUIDADE


O PREÇO DA INGENUIDADE
Um dia, o cágado tinha saído para passear. Sorrateiro, lá se ia ele, vagaroso, pois tinha todo o tempo do mundo para gastar naquele passeio. De repente, ao atravessar uma estrada em busca de comer qualquer coisa, ele descobriu uma trilha de formigas. Como estava mesmo sem fazer nada, resolveu fazer uma perversidade com elas. Passou por cima da trilha e esmagou um bocado de formigas que estavam carregando comida.

Confiante na sua superioridade, seguiu em frente, conversando sozinho:

− Afinal, quem vai se incomodar com algumas centenas de formigas esmagadas?
E lá se foi ele. Apressou o passo para sair daquele lugar, mas pisou em falso, caiu de barriga pra cima e ficou se esperneando, sem poder se desvirar. Caro lhe custou sair daquela posição. Depois de muito esforço, se desemborcou. Passou um tempo retomando o fôlego e seguiu adiante.

Já perfeitamente recuperado, o cágado ouviu uns gritos e quis saber do que se tratava. E quando chegou ao lugar de onde vinha o alarido, o cágado viu: era a onça segurando firme o macaco pelo rabo. O prisioneiro se esperneava, rodava, guinchava e nada da onça soltar o rabo dele.

O cágado tem lá suas qualidades, todos os bichos sabem disso.  E ele quis saber do que se tratava. Afinal, aquele escarcéu estava tirando o sossego de todo mundo. O macaco, muito aflito, resolveu contar, enquanto a onça também se sentou, aguardando. A onça tinha caído numa armadilha e ficou presa três dias, com fome, pedindo socorro. O macaco ouviu o alarido, procurou e descobriu a onça no fojo. Todo prestativo, resolveu ajudar da maneira que sabia. Providenciou um cipó, mas o cipó era curto e não chegava até o fundo da armadilha.

Mas ele não ia desistir tão fácil assim. Logo ele, tão gabado por todo mundo, pela sua esperteza e sagacidade... Dependurou-se no cipó, estirou o rabo e mandou que a onça escalasse a parede do fojo, agarrada ao rabo dele. Assim a onça fez e conseguiu sair da armadilha. Agora ela não queria soltar o rabo dele.

O cágado, então, disse ao macaco que seu depoimento era maravilhoso. E que agora ele batesse palmas e limpasse as mãos no chão, pois era assim que se devia proceder no final de um depoimento. Assim o macaco fez. A onça assistiu a tudo, muda, na certeza de que, agora, ia ter duas refeições... Pois bem, o cágado disse para a onça que também queria ouvir o depoimento dela. A onça disse que não ia mais largar o rabo do macaco, porque ela estava com fome há três dias e macaco era uma boa caça. Mesmo, não havia razão alguma para ela soltar o rabo do macaco.

O cágado elogiou o depoimento da onça e disse que ela procedesse do mesmo modo que o macaco fez: batesse palmas e limpasse as mãos no chão. A onça fez o que o cágado mandou. Aí, o macaco aproveitou o vacilo da onça, escapuliu e sumiu na copa das árvores. A onça, irada, deu um bote certeiro, pulou em cima do cágado, estraçalhou sua carapaça e devorou o bicho num instante.

Pois é... A gente não paga apenas o mal que pratica. Também paga muito caro, as besteiras que comete.

O OVO ANUNCIADO


O OVO ANUNCIADO
A galinha estava assanhada. Queria descobrir um meio de valorizar seu produto. Sem saber o que fazer, mal chegava a madrugada e ela descia do poleiro, agoniada, nervosa, ciscando tudo que encontrava. Uma comadre já bem idosa, vendo aquele eterno entra-e-sai da galinha, deu um conselho:

− Olhe, por que a senhora não vai fazer uma consulta? Senhora, se cuide... Em vez de ficar nessa agonia, vá a quem pode lhe ajudar a encontrar as respostas...

A galinha, então, depois de muito pensar, venceu a indecisão e foi fazer a consulta. E lhe foi aconselhado botar a boca no mundo. E assim ela fez: ao botar um ovo, cacarejava a não mais poder. Todo mundo ficava sabendo, de imediato, quando a galinha desovava e queria obter o que ela produzia. Enquanto isso, a pata, quieta em seu canto, a tudo espiava, calada. E resolveu também fazer uma consulta, mas nunca se soube o que lhe foi revelado. Sabe como é: esse povo, assim, calado, quieto no canto, jamais deixa que se saiba o que está realmente acontecendo. Mas deixemos isso pra lá.

Acontece, porém, que surgiu um mal de asma nas crianças da aldeia. As mães, aflitas, gastavam ovos e mais ovos de galinha para curar os filhos, mas a doença não cedia. Uma das moradoras, já em desespero com o sofrimento do seu filho, resolveu, então, experimentar um ovo de pata como remédio. Usou, de início, apenas um ovo, até mesmo por medo de que aquilo, realmente, não servisse pra nada. Sabe como é: esse negócio, assim, não anunciado, ninguém conhece direito... Aquela mãe bateu um ovo de pata com mel de abelhas e sumo de mastruz. Mas não é que a asma cedeu?! A mãe bem sucedida contou a outra mãe que contou a outra mãe e, assim, foi um gastar de ovo de pata como nunca se viu antes.

As crianças ficaram curadas. As mães, no entanto, ficaram muito intrigadas com aquilo. Por que a pata nunca tinha dito isso a ninguém?  Seria por pura ruindade? Por trás daquele silêncio tinha de haver uma explicação... A vizinha do pé da ladeira, a mais bisbilhoteira de todas, tomou a iniciativa e foi à casa da pata, assim, como quem não quer nada e querendo. Chegou lá, conversou, conversou e conversou. E na volta, todo mundo ficou sabendo do que a pata tinha dito: O que é bom nem sempre é anunciado

O FOFOQUEIRO


O FOFOQUEIRO
Ninguém mais sabia o que fazer: havia uma fuxicada terrível, pois tudo o que se falava no palácio se espalhava pela cidade. Oxalá, o mais-velho, irritado com a situação, ordenou que se apurasse tudo, tim-tim por tim-tim. Principalmente que se observasse os freqüentadores mais assíduos, aqueles que tinham trânsito livre. Ninguém deveria deixar de ser observado. De repente, ficou bem visto que os mais assíduos freqüentadores eram dois: Carneiro e Martim-Pescador. Mas havia uma tremenda diferença entre eles, pois enquanto Carneiro era calado, reservado, manso, sempre de vistas baixas, Martim-Pescador era o cão por dentro do mato. Se metia nas conversas, vivia de entra-e-sai, dando notícia de tudo. Parecia uma tempestade.
Então foram dizer a Oxalá que já sabiam quem era o falador. Quando anunciaram que era Martim-Pescador, Iansã, a Mãe dos Ventos, agitada que só ela, tomou a palavra e pediu tempo para provar a inocência de seu protegido. Oxalá deu o tempo e Iansã saiu apressada como um raio. Daí, ela chamou Martim-Pescador e Carneiro e disse assim:

− Vai ter uma festa no palácio de Oxalá...

Interrompeu o que estava dizendo, pôs as mãos na cintura e percorreu os dois de alto a baixo, com olhares de autoridade, reprovação e cobrança. Depois, continuou:

 − Oxalá vai premiar a quem aparecer com a melhor fantasia vermelha. Mas isso é segredo. Ninguém deve saber disso. Finjam que não sabem de nada e bico calado. Olhem lá, viu!  Principalmente o senhor, Seu Martim-Pescador, com sua língua de trapo....

Pois bem. No dia da festa, foi chegando bicho, foi chegando gente, foi chegando encantado e o salão ficou repleto. E aí todo mundo viu: somente Carneiro e seus parentes estavam fantasiados de vermelho. Oxalá tem ojeriza a cores fortes e já estava sabendo de tudo, porque Iansã tinha contado a ele. Mandou expulsar Carneiro e sua gente daquela festa. E todo mundo ficou sabendo: era o manso e silencioso Carneiro o fofoqueiro do palácio. Apenas Martim-Pescador ficou morrendo de pena do Carneiro.

Mas é isso: Ninguém julgue o bom por bom, nem o mau por mau.

O ENGANO DO AMENDOIM


O ENGANO DO AMENDOIM
Contavam os mais velhos que o pé de amendoim não andava nada satisfeito com a vida. Aquele negócio de ele botar semente apenas na raiz, sem ninguém poder ver o quanto ele era farto, deixava ele nervoso, aborrecido, contrariado. E ainda tinha mais uma coisa: sua ramagem era pequena, quase nem era notada. Logo ele, cujas sementes serviam para preparar um delicioso prato para Oxóssi, o Grande Caçador... E os homens mais idosos, ou os sem tenência, então... Esses eram os mais beneficiados, quando comiam suas sementes. Com tanta energia para oferecer aos humanos e estava ele ali, com uma ramagem sem expressão e as sementes escondidas debaixo da terra. E quando os humanos faziam a colheita, metiam a mão nas suas intimidades, arrancavam suas vagens e simplesmente deixavam suas ramas para secar em cima da terra. Ah, era demais!

Seu vizinho, o pé de feijão, lhe aconselhou fazer uma consulta. Assim fez o pé de amendoim. Disseram a ele que bem seria melhor se ele prestasse atenção nas suas raízes. Era próprio dele o axé correr todo para baixo. Era assim que sua raiz podia sustentar tudo e produzir sementes. Mas em todo caso, logo que ele queria inverter as coisas, ajuntasse as ramas secas da última safra e se alimentasse com elas. E quando chegasse o tempo de enramar, fosse botando brotos, brotos e mais brotos e aguardasse o resultado.

E assim fez o pé de amendoim. Então, aconteceu a maravilha: ele botou tanta rama, mas tanta rama, que invadiu os quintais, os outros pés de planta, as cercas, os telhados, tudo. E o povo ficou admirado com aquilo. O pé de amendoim se transformou na mais feliz das plantas. Nem cabia em si de tanta alegria: era motivo para olhares, elogios e até mesmo invejas e ciumadas.

Pois bem. Chegou o tão esperado tempo da colheita. Acontece que a Natureza não lhe concedeu a capacidade de botar sementes na rama. E aí foi aquele desconforto. Não acharam nenhuma semente nem nas suas ramas, nem na sua raiz. E que fez o povo? Passou a não dar a menor atenção ao pé de amendoim. Ao contrário, ele foi considerado um incômodo. Aquelas ramas, sem serventia para nada, deviam ser cortadas e queimadas. Afinal, havia plantas produtivas precisando de espaço.
            Nem é preciso dizer: o pé de amendoim entrou em outra crise, pior do que a primeira. Noites sem dormir, dias sem comer, queixas aos vizinhos, todo jururu, numa lamentação que fazia dó. E lá se foi ele fazer nova consulta. Quando voltou de lá, tinha uma nova decisão: ia deixar esse negócio de ramas para lá e dar toda atenção às suas raízes. De que adiantava tanta rama bonita se a serventia dele estava na raiz? Afinal, a aparência, mesmo bonita, não substitui a essência. 

O CHAPÉU DE DUAS CORES


Contavam os mais-velhos que, na Aldeia de Ajalá, havia dois irmãos muito unidos. Eles jamais tinham brigado entre si. Nunca tinham se aborrecido um com o outro. A fama daquela amizade corria as aldeias e todo mundo comentava, fazendo disso admiração geral.

Um dia, Exu andava por aquele lugar e ouviu comentários sobre o fato. Então, ele resolveu fazer um teste sobre a fortaleza daquela amizade. Descobriu os dois irmãos trabalhando num campo, que era dividido ao meio por uma estrada estreita. E eles trabalhavam cantando, cortando o mato com facões bem amolados, conversando sobre diversos assuntos. Aí, Exu pôs na cabeça um chapéu pintado de vermelho e preto, sendo que de cada lado só se via uma única cor.

Então Exu passou pela estrada, entre os dois irmãos e os saudou, dizendo:

— Bom dia, irmãos unidos!

E os irmãos responderam a Exu em uma só voz. Mas Exu passou por entre eles, sempre olhando para frente e seguiu adiante, até desaparecer na curva da estrada. Aí, um dos irmãos perguntou ao outro:

— Quem era aquele homem de chapéu vermelho?

Ao que o outro respondeu:

— Mentira sua! O homem usava um chapéu preto...

O irmão que viu o homem de chapéu vermelho se sentiu ofendido e, pela primeira vez, mostrando-se aborrecido, devolveu a ofensa. E o que tinha visto o homem de chapéu preto ficou aborrecido também. Daí, eles começaram a discutir, num desentendimento sem igual. A raiva cresceu tanto, que eles terminaram se agredindo com palavras. As ofensas trocadas se agravaram e eles terminaram avançando um sobre o outro, armados de facão. Brigaram tanto que se mataram. E porque eles não tinham herdeiros, o campo ficou entregue às feras e às ervas daninhas.

É por isso que, até hoje, nas aldeias, os mais-velhos ainda avisam:

— Se lembre do chapéu de duas cores: Nem tudo é aquilo que parece ser...

A RESPOSTA DO CORAÇÃO


A RESPOSTA DO CORAÇÃO
Kirina estava bem do seu, arrumando os acaçás no tabuleiro, quando um barulho de passos apressados lhe chamou a atenção. E seu cabelo ficou arrepiado com o que estava vendo: um batalhão caminhava em sua direção. Essas coisas, soldado, exército, farda, sempre mexiam com sua natureza. O pensamento deu mil voltas e ela ficou assim, meio atoleimada, sem atinar na razão da presença de tantos soldados.

Diante do tabuleiro, por ordem do comandante, os soldados pararam. Eta pedaço de homem, Kirina viu. Alto, de bom corpo, olhos de gato, voz de touro. Kirina sentiu outro arrepio mais forte ainda e parecia que o chão tremia debaixo de seus pés.

— Bom dia, Dona!

— Bom dia Ioiô! Em que posso lhe servir?

— Meu batalhão está morrendo de fome. Estamos em diligência de guerra e há dois dias a gente não come nada. A Dona pode dar alguma coisa a gente para comer?

Kirina sentiu um baque no coração. A semana não tinha sido lá essas coisas, a vendagem foi pouca. Ela estava justamente contando com alguns trocados que entrassem hoje. E agora estava ali aquele comandante a lhe pedir seus quitutes de graça.... E lá se foi o pensamento de Kirina fazendo voltas. Viu os filhos que ficaram em casa, esperando as providências, a mãe paralítica que dependia dela... Mas seu coração bradou lá dentro, repleto de sentimento, mandando compartir. Quando conseguiu abrir a boca, Kirina não fez por menos:

—Olhe, Ioiô... Aranha vive do que tece, mas é Deus e Ogum que deixam a aranha tecer. Mesmo, hoje por ti, amanhã por mim... O que Deus dá é pra todo mundo e Ogum não vai me faltar no dia de amanhã. Pode mandar os outros moços se servir...

O comandante deu a ordem e ficou parado, ao lado de Kirina, enquanto os soldados comiam. Num instante, o tabuleiro ficou vazio. Kirina ainda ofereceu água, que ela sempre trazia num barril. Quando tudo acabou, os soldados se afastaram e o comandante, todo faceiro e sorridente, disse:

— Bom... Dinheiro, eu não trago. Mas tenho aqui umas coisas ajuntadas na guerra. Chamou um dos soldados e deu uma ordem. O ordenança, então, trouxe um enorme saco de couro e entregou ao comandante. O oficial entregou o saco a Kirina e disse:

— Abra. É seu...

Meio desconfiada, Kirina obedeceu. E quando abriu o saco, quase dá um ataque. O surrão estava apinhado de coisas de valor, moedas, coroas, ferramentas, um tesouro, enfim. E ela ficou um tempo enorme, entretida, examinando as coisas que estavam dentro do surrão. Quando levantou as vistas, o batalhão não estava mais ali. Aí, Kirina caiu em si: aquilo era coisa de Ogum, só podia ter sido ele... De longe, o comandante apreciava Kirina sorrindo e, virando-se para seus soldados, afirmou: Não se vence batalha apenas com espada na mão. Também se vence com as armas do coração.

A MUDANÇA E O CORAÇÃO


A MUDANÇA E O CORAÇÃO
Havia uma aldeia em que até os jovens viviam desiludidos, porque ali não acontecia nada de novo. As pessoas conservavam os mesmos hábitos desde muitas gerações. A pasmaceira terminou tomando conta de tudo e de todo mundo. Então, o chefe da aldeia resolveu fazer uma reunião com os seus conselheiros. Depois de muito discutirem, e sem chegar a uma solução prática, todo o conselho decidiu que o melhor era consultar Xangô.

Na consulta, Xangô aconselhou, sem muita conversa:

− Façam uma grande mudança em tudo.

Aí, o Conselho dos Mais-Velhos designou um grupo de homens e mulheres para realizar as mudanças necessárias. O povo foi convocado para participar ativamente. Queimaram as palhoças e fizeram outras novas. Mudaram os roçados de lugar. Até mesmo passaram a apanhar água de beber em outra fonte. As mulheres teceram novas roupas, as crianças inventaram novos brinquedos e todo mundo ficou contente.

            Mas vai daí a algum tempo, eles foram notando que alegria estava se desfazendo. A rotina trouxe de volta o mesmo desânimo de antes. A fonte nova, as novas palhoças, as brincadeiras novas, nada adiantou. A tristeza tomou conta de todos. O chefe convocou o Conselho novamente. Outra vez, resolveram consultar Xangô.

Perante o orixá, tudo foi relatado miudamente e Xangô ouviu a conversa com atenção. E ainda se queixaram de que a solução apontada na primeira consulta não deu resultado. Então Xangô quis saber:

− Que mudanças vocês fizeram lá dentro?

Ficaram sem entender a pergunta e pediram uma explicação. Xangô explicou com a mesma severidade de costume:

− Ora! Dentro das pessoas, no modo de ver o mundo, a vida, um ao outro... Dentro de vocês mesmos...

Olharam um para o outro, cochicharam entre si. Terminaram por chegar à conclusão que, na verdade, cada um permanecia como era antes. Então Xangô disse:

— A verdadeira mudança tem que acontecer primeiro, no coração!

A LONJURA E A DEMORA


A LONJURA E A DEMORA
Contavam os mais-velho que, tempos depois da criação do mundo, Olorum andava querendo saber como os humanos entendiam o espaço no tempo e o tempo no espaço. Tinha que escolher um embaixador de tarimba: firme, decidido, paciente, profundamente observador e, principalmente, que soubesse aguardar sem dar um vacilo. Ninguém melhor do que Iroco, o Mestre do Tempo. Dito e feito: Olorum mandou e Iroco veio ao Iluaiê, para descobrir o que Olorum queria saber.

Iroco recebeu ordens de procurar uma aldeia muito antiga e conversar com Iroju, que era o morador mais velho do lugar. Procura daqui, procura dali, e ele terminou tendo informações sobre a aldeia, onde ele podia encontrar Iroju, o morador mais velho entre os mais-velhos da Terra. Depois de dias procurando, Iroco encontrou um homem que tinha uma boa informação. Iroco, chegou, bateu palmas e o homem veio atender. Terminou dizendo assim:

− Ah, moço, eu estou muito contente hoje. Um filho meu que está ausente há muito tempo vai chegar daqui a três dias. Logo, logo, ele vai estar aqui e o tempo é muito curto para eu tomar as providências que quero.
O homem conversou muito e animou Iroco a prosseguir. Disse que a casa do velho ficava perto dali e indicou a direção.

Iroco agradeceu e se despediu. Andou muito, até que precisou procurar outro informante. Terminou encontrando outro homem, que pouco conversou. Apenas disse o seguinte:

− Ah, moço, eu estou muito preocupado com a ausência de um filho meu. Olhe, ele saiu tem uma hora e ainda não voltou. Eu não agüento mais essa demora. Tanto que eu queria saber em que lonjura ele está...

Iroco ficou por ali, olhando o mundo, esperando pacientemente, para colher mais alguma informação. Mas o homem continuava amuado e não adiantou puxar conversa.

Para se ver logo livre da visita, o homem informou:

− Dizem que a casa do velho que o senhor procura fica para as bandas de lá... Mas é muito longe. Mas muito longe mesmo...

E apontou na direção a ser seguida. Iroco se despediu agradecido e se pôs a caminho. Para sua surpresa, logo depois da primeira curva da estrada, avistou a casa do velho, embora tivesse recebido a informação que a casa ficava muito longe. Andou só um pouquinho e foi logo chegando aonde queria.

Mas antes de se aproximar da casa de Iroju, Iroco resolveu descansar um pouco para pensar. Sentou-se numa pedra, debaixo de um arvoredo e ficou pensando sobre tudo o que viu e ouviu, naquela tão longa e, ao mesmo tempo, tão curta viagem. E ele terminou concluindo que nem precisava mais conversar com Iroju, pois já sabia a resposta para ser dada a Olodumare: A lonjura e a demora têm o tamanho da preocupação.

A JACA MOLE


A JACA MOLE
Oxalá amanheceu com vontade de viajar. Olhe que isso é uma raridade acontecer. É tão raro, que os outros orixá atenderam, de imediato, ao chamado dele para participarem. Saíram de madrugadinha. Oxalá é assim: só começa as coisas antes do raiar do dia. E lá se foram, em fila indiana. Todo mundo andando sem pressa, pois Oxalá é lento, vagaroso e só anda em último lugar.

Iansã, acostumada com a agonia de sua tempestade, foi ficando impaciente. Olhava para um canto, olhava para outro, mirava o horizonte sem fim bem lá longe. E foi ficando cada vez mais agoniada. Começou a pensar consigo mesma:

−Ah, se eu estivesse sozinha... Logo, logo eu estava lá.

Se pelo menos Xangô, seu parceiro de agonia, resolvesse lhe acompanhar... Mas que nada: Xangô hoje estava decidido fazer companhia ao mais-velho...

A agonia aumentou tanto, que ela não suportou mais andar no passo do cágado. Aí, ela rodopiou e seguiu em frente sozinha. Lá, bem adiante, parou. Ficou embaixo de uma jaqueira, enquanto observava o grupo que se arrastava lentamente, por causa de Oxalá. A essas alturas, ela já estava pensando no que ia fazer depois que voltasse da viagem. Assim, ela navegou nos pensamentos, fazendo mil projetos. E a ventania corria pelo mato, derrubando folhas verdes e maduras.

Quando ela estava assim, bem de seu, uma jaca-mole, bem madura, despencou bem em cima de sua cabeça. Ela ficou banhada de visgo e melaço de jaca, da cabeça aos pés. Tomou um susto enorme, deu um grito e ficou sem saber o que fazer. Aí, ela se sentiu profundamente desamparada e resolveu voltar ao encontro do grupo.

Todo mundo notou a melação, mas ninguém disse nada. E ai de quem perguntasse qualquer coisa... De cabeça baixa, ela passou por Oxalá e tomou o último lugar na fila, atrás dele. Iansã apenas ouviu a última frase de uma conversa, que já estava terminando, entre Oxalá e Omolu, os mais velhos entre os mais-velhos:

− Pois é... Como o senhor bem sabe, esse povo assim, agoniado, precisa aprender:Quem só anda às carreiras vai ter que voltar muitas vezes, para vencer a agonia.

A GRANDEZA E A OBRIGAÇÃO


A GRANDEZA E A OBRIGAÇÃO
Na criação do mundo, Olodumare deu a Oxum o privilégio de atender aos mortais e responder às perguntas feitas por eles no jogo de búzios. Ela nem queria isso, mas foi distinguida com tal fidalguia. Com o tempo, sempre fazendo a mesma coisa, Oxum estava ficando enfadada com a atividade de ter de responder às perguntas dos humanos. Era tanta pergunta, uma miudeza que não acabava mais. Gente que de nada entendia e queria saber de tudo, perguntas sem cabimento, encabulações, interesses descabidos, teimosias, mágoas, ódios, sede de poder, inveja, treitas, ciúme... Olhe, senhor, tanta coisa... Enfim, todo esse bolodório que só os humanos sabem viver.

Ela resolveu, então, deitar-se no remanso do rio e cochilar um pouco para ver se encontrava uma solução. Quando estava naquele soninho, vai mas não vai, um estalido chamou sua atenção. Abriu os olhos... Quem estava ali? Ele, Exu, o que gosta de ser grande em tudo. Todo galanteador, ele abriu a boca e disse:

− Olá, Senhora dos Búzios, Dona da Beleza! Que faz assim, toda largada nas águas?

− Eu?! Estou aqui, assim... Pensando em passar os direitos de minha grandeza a quem queira ficar com eles...

Muito interesseiro, Exu logo quis saber:

− Como assim?!

− É que eu tenho a grandeza e por isso sou eu quem responde às perguntas dos mortais, quando eles querem saber das coisas no jogo de búzios. Papel importantíssimo, esse meu.

Exu se fingiu bajulador e disse assim:

− Pois é... Os grandes têm lá suas grandezas... E eu por aqui, nesta pendanga de equilíbrio. É equilíbrio para aqui, equilíbrio para ali... Uma chatice...

Oxum percebeu que Exu estava começando a morder a isca e se empenhou numa negociação. Cautelosamente, pois ela sabia como Exu é malicioso, ardiloso e interesseiro. Enfim, ele não bate prego sem estopa. E foi fundo numa proposta:

− Que tal a gente fazer assim? Eu te passo essa grandeza que é só minha, toda minha, a de responder a tudo que os mortais querem saber e, ainda de quebra, você fica com o privilégio de ser servido em primeiro lugar. Então eu vou ter tempo para lustrar minhas pulseiras e meus anéis, me mirar nos meus espelhos, me enfeitar na hora em que eu bem quiser e entender...

Claro que Exu aceitou. E aí os dois fizeram o pacto e um ebó sacramentou a mudança de papéis entre eles dois. E mal Exu deu as costas, feliz e sirigaiteiro, pela estrada a fora, Oxum sumiu nas águas encantadas do rio.
Dias depois, Exu voltou, arrependido, à procura de Oxum para desfazer o pacto. Mas ela tinha se sumido nas águas. E tanto procurou até que foi encontrar a Senhora das Águas, toda sorridente, enfeitando-se numa cachoeira. Queixou-se muito, mostrou as desvantagens da troca e o enorme prejuízo que estava tendo, mas Oxum nem quis saber de conversa: mergulhou nas águas e sumiu.

Daí, Exu se apresentou a Olodumare e pediu para ele obrigar Oxum a desfazer o trato. O Controlador do Destino ouviu tudo e, depois, se pronunciou:

− O que está feito, está feito. Palavra dada, destino empenhado. Agora é tarde... Afinal, você sempre quis ser considerado O Maior em tudo. Pois fique sabendo: Os grandes são escravos de sua grandeza.

A FEIÚRA E A BONITEZA


A FEIÚRA E A BONITEZA
A coruja, antes de se casar, tinha feito uma consulta. Ela queria saber das intenções do corujão, se ele realmente gostava dela, essas coisas assim... Pois bem: foi dito a ela que tudo estava em ordem, que ela não se preocupasse. Apenas prestasse atenção no fato de que, nem tudo de que ela gostava, os outros gostavam também.

Ela saiu muito satisfeita da consulta. De vez em quando, se lembrava do conselho sobre o gostar, mas isso foi caindo no esquecimento com o passar dos dias. E agora estava ela ali, feliz da vida, já criando sua primeira ninhada. Os meninos já estavam se empenando e logo, logo, estariam voando também.

Ah, mundo velho sem porteira... Pois não é que o urubu chegou esbaforido para dar uma notícia ruim? A mãe da coruja estava passando mal e queria ver sua única filha. A coruja se entristeceu e ficou pensando como haveria de fazer para ir ver a mãe. Os meninos ainda não podiam voar. Deixar aquelas coisinhas tão bonitinhas, assim, sem proteção? Também não podia deixar de atender ao chamado da mãe. Podia ser a última vez. Depois de muito pensar, a coruja se lembrou e conversou consigo mesma:

− Ah, sim! Comadre Raposa... Gente fina está ali. Prestativa, sutil, tem sempre um jeito pra tudo... Mesmo, basta um voozinho de nada e posso passar na toca onde ela mora.

Logo a coruja alcançou a toca da raposa, cuja porta estava sempre disfarçada. Chamou e a raposa atendeu. Contou tudo, debaixo de aflição e agonia. Por fim, o pedido:

− Comadre da minh’alma, me ajude pelo amor de Deus! Vou e volto logo. Apenas queria que a senhora olhasse meus lindo meninos... Tomasse conta deles até eu voltar...

A raposa não se fez de rogada:

− Faço isso, sim, comadre.... Mas como saber quais são seus meninos, com tanto ninho espalhado por aqui? A senhora sabe: eu vivo no chão e a senhora nos galhos...

A coruja deu as instruções necessárias:

− Tá vendo aquela árvore seca lá adiante? Pois é lá, no oco mais baixo que eles estão. E é muito fácil a senhora saber quem são eles. São os meninos mais bonitos de toda essa redondeza. Olhe, eu passo horas a fio só olhando pra eles. Uma lindeza!...

Despediram-se. A coruja foi pelos ares, em busca da casa da mãe. A raposa se dirigiu para a árvore seca, bem perto da sua toca. Foi um alarido, quando a passarada viu a raposa se aproximando. Gritos, bater de asas, vôos espalhafatosos, enfim, um danor. Mas a raposa estava decidida: dessa vez não escaparia nenhum menino feio. E foi passando de ninho em ninho, devorando tudo.

Com poucas horas, a coruja voltou. Logo foi avistando a comadre dormindo ao pé da árvore. Aquilo que era gente boa e prestativa. Mas quando ela pousou no ninho, uma onda de terror invadiu seu coração. Cadê os lindos meninos?! Tudo vazio. Desceu, acordou a raposa e, muito aflita, quis saber dos filhotes. A raposa, então, ainda meio sonolenta e se lambendo, explicou:
− Olhe, comadre, lhe garanto que seus lindos meninos estão em paz. Desde que a senhora saiu, eu vim logo para aqui. Só devorei meninos feios. Naquele ninho ali, então, havia os mais horrorosos deste lugar...

− Comadre, a senhora devorou meus lindos meninos!...

E a raposa, toda espantada, apenas comentou:
− Meu Deus! Comadre, a senhora não tem juízo mesmo... Nunca desconfiou disso?A feiúra e a boniteza estão nos olhos de quem vê.

A ESCOLHA DO DESTINO


A ESCOLHA DO DESTINO
Um homem vivia em paz no meio de seu povo. Era um excelente mercador, sua voz cristalina e sonora atraía multidões. Todos os seus produtos eram vendidos rapidamente, de forma que ele quase não dava conta do atendimento a quem procurava suas mercadorias. Mas ele era inconformado com o seu destino. Gostaria de ter nascido um grande cantor para arrebatar as pessoas com a maravilha de sua voz. Ainda que sua fama de mercador corresse o mundo, ele queria mesmo ter nascido com outra sorte.

Um dia, ele resolveu consultar Ifá, para ver se poderia mudar o seu destino. Ifálhe recomendou um ebó a ser oferecido no olho do dendezeiro e que ele dormisse ao pé da palmeira por três noites consecutivas. Assim o homem fez. Terminado o prazo do ebó, ele voltou para sua cidade, enquanto aguardava a resposta dos divinos. Então, ele avistou uma grande caravana que caminhava em sua direção. Imediatamente ele pensou em se reabastecer de mercadorias, afinal estava precisando negociar. Quando chegou perto, o homem notou algo diferente. Não se tratava de uma caravana de negociantes e sim de um Mago e seus acompanhantes. Então o homem pensou em falar com o Mago para tentar trocar seu destino.

Feita a proposta o Mago aceitou, mas impôs uma condição: o homem não poderia desfazer a troca, depois que a magia fosse realizada. Aceita a condição, o Mago lhe mostrou inúmeras e inúmeras caixas fechadas que guardavam destinos dos humanos. Ele teria que escolher uma delas pela aparência. O homem pensou, pensou, olhou, olhou, examinou muitas e muitas caixas. Por fim, uma delas atraiu sua atenção. Era leve, forrada de pele de camelo, couro bem tratado, enfeitada de fios de ouro e muitas pedras brilhantes. Havia até uma inscrição: VOZ DE OURO, ENCANTADOR DE MULTIDÕES.

Era justamente isso que ele queria. E ele ficou tão encantado, tão feliz que, diante de tanto contentamento, o Mago resolveu lhe dar a caixa e fazer a troca de destino sem receber pagamento nenhum. Quando o homem abriu a caixa, ansioso pelo novo destino, lá dentro estava seu nome e, embaixo do nome, a palavra MERCADOR.

Diante de seu espanto, o Mago se revelou:
− Eu sou Orumilá, Testemunha do Destino, aquele que esculpe no escuro. Este é o seu caminho e fique sabendo: Ninguém foge desta força dentro da pessoa que faz ela se tornar aquilo que realmente ela é.

ITAN: HISTÓRIAS DO SISTEMA ORACULAR JEJE-NAGÔ


ITAN: HISTÓRIAS DO SISTEMA ORACULAR JEJE-NAGÔ
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé Quando os negros foram trazidos da África para o Brasil pelo sistema de escravidão, consigo trouxeram também um conhecimento amplo que sustentava suas relações entre si, e possibilitava uma compreensão do universo e da vida totalmente diferente da cultura da Europa. O sistema de exploração de braço escravo fez com que os negros oriundos da África Ocidental, principalmente do Golfo de Benin, terminassem por aportar na América. Por mais discriminados e isolados de seus conterrâneos, fundamentos de sua cultura sobreviveram também no Brasil. Isso se deve em grande parte ao fato de eles não separarem a vida cotidiana das práticas de re-ligação com o divino. Entre os inúmeros fenômenos das culturas importadas da África, o sistema oracular, através do qual se consultava as divindades, era de importância fundamental, uma vez que a convivência diuturna entre criadores e criaturas era fenômeno evidente entre os africanos.

Um dos sistemas da consulta ao oráculo era o jogo de Ifá, constituído de 16 sinais (odu) básicos, com várias histórias (itan) que configuravam cada um deles. As histórias, porém, encerravam princípios de ética e moral, através dos quais se estruturavam e se sustentavam as relações entre os humanos e os divinos e também dos humanos entre si. Assim, pessoas, animais, e até plantas se configuravam verdadeiros personagens, portadores de qualidades e defeitos, nas histórias que serviam de base à leitura e interpretação do odu. Tendo em vista que o conteúdo de cada odu abarca inúmeras histórias, o sistema exigia uma memória excelente, além da capacidade em atinar qual das histórias fazia sentido em relação à pergunta feita pelo consulente. Daí porque os sacerdotes de Ifá, normalmente, em África, tinham uma vida de certo recolhimento e dedicavam sua existência aos estudos de tal conhecimento.

No Brasil, por força do sistema escravagista que se negou estupidamente a reconhecer os valores das várias culturas africanas, os sacerdotes do culto a Ifá, os babalaôs, não sobreviveram. Em conseqüência, o jogo-de-búzios se popularizou, substituindo o jogo do opelé de Ifá. Ocorre, porém, que o jogo-de-búzios é oriundo do jogo do opelé e conserva a prática da leitura dos odu. Assim, criou-se uma possibilidade de sobrevivência do sistema oracular e suas histórias elucidativas. Um outro fator a considerar também é que, por força do contexto cultural construído no Brasil colônia, também o sistema de origem européia adotava as histórias infanto-juvenis para transmitirem fundamentos de ética e de moral tão necessários em qualquer sociedade humana. Por isso mesmo, muitas histórias do sistema oracular passaram a fazer parte do repertório contado nas varandas da casa-grande, na roda do terreiro das fazendas ao luar, nas senzalas. Evidentemente, um sem número delas se perdeu com o passar do tempo, enquanto outras se firmaram e constituem atualmente parte integrante do cabedal cultural do Brasil. E as histórias², principalmente aquelas em que os personagens são apenas os humanos, os contos, as narrativas tão bem se integraram ao patrimônio brasileiro que, para a maioria, já não se guarda mais a memória de sua origem.
¹ Publicado na Revista Kàwé, Ilhéus: Editus, n.° 1, 2.000, p. 15-19.
² Na edição da Revista Kàwé, constavam dois itan. Agora, acrescento mais dez, para uma cobertura mais ampla das diferentes tipologias dos itan, em que os personagens são humanos, ou bichos, ou seres divinos, ou plantas, podendo até aparecerem juntos

OXALÁ

OXALÁ
Orixá da paz e do amor, considerado pai da criação. Oxalá tem ojeriza às cores preto e vermelho. Não suporta sal, azeite de dendê e bebidas alcoólicas. Prefere pombos e igbin, espécie de caracol também conhecido por boi-de-Oxalá. Seus devotos lhe ofertam grande quantidade de milho-branco cozido. Gosta do silêncio e da quietude. Não suporta vozerio, alarido, nem sujeira. Seu dia consagrado é a sexta-feira, quando os adeptos do candomblé, geralmente, passam o dia vestidos de branco. A ele, o povo-de-santo dedica o mais profundo respeito e eterna reverência, pois o considera a luz do mundo. Em qualquer ritual dos terreiros, Oxalá é o último a ser saudado. Após sua palavra, nada mais pode ser dito. Tem duas manifestações: uma, de jovem guerreiro e outra, de velho alquebrado. Quando jovem, ele é OXAGUIÃ. Traja-se de branco ou prateado, carrega escudo, espada e uma mão de pilão. Quando velho, ele é OXALUFÃ. Traja-se de branco, dobrado ao meio, claudicante, apoiado em um longo cajado ritual, o opaxorô

Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

IEMANJÁ


IEMANJÁ
É a grande-mãe dos mares e oceanos. De seios fartos e acolhedores, é considerada mãe dos orixás e, portanto, dos homens também. Gosta de adornos femininos, flores e perfumes. Veste-se de azul-claro e branco ou prateado. Carrega em uma das mãos uma adaga curta e, na outra, um espelho, o abebé, símbolo de seu real poder. A ela são dedicadas festas públicas que congregam multidões em várias cidades costeiras do Brasil, quando lhes são oferecidos dezenas de balaios repletos de objetos do seu agrado. Seu dia preferido é o sábado. Gosta de galinhas e cabras brancas, ovelhas e patas.Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

EUÁ


EUÁ
Esposa de Obaluaiê e, por isso também, é tratada com muita reverência. Preside as águas e tem poderes sobre os mortos, atributos que aprendeu com o esposo. Uma de suas moradas é o arco-íris e, por isso, é tida como a cobra fêmea de Oxum-marê. Seus filhos obedecem a sérias restrições, a exemplo de não comer galinha, animal que ela detesta. Veste-se de vermelho e dourado e traz na mão uma espécie de cabaça presa a uma haste, enfeitada com palha-da-costa. Gosta de acarajé e de feijão-fradinho enfeitado com rodelas de ovos.Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

OBÁ


OBÁ
Grande Guerreira, uma das três esposas de Xangô. Numa querela com Oxum, para obter a preferência do esposo, cortou a orelha esquerda e, com ela, temperou um amalá para Xangô. Passou a esconder a mutilação com a mão esquerda, ou com o escudo, ou com um turbante. É destemida, mas é ressentida e gosta de ouvir por trás das cortinas. Veste-se de vermelho, branco e dourado. Carrega espada e escudo. Gosta de acarajé, aberém, feijão fradinho, cabras, galinhas e coquéns. Recebe culto às quartas-feiras e seus filhos são uma raridade.
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

OXUM


OXUM
Senhora das águas doces, dos rios, cachoeiras e fontes. Rege a riqueza, o ouro, o luxo, a vaidade, a beleza e a grandeza. Preside a maternidade e se constitui uma das mais conhecidas imagens arquetípicas da grande-mãe dos nagôs. Veste-se de amarelo em suas várias tonalidades, mas não dispensa o dourado. É uma das esposas de Xangô. Enfeita-se com muitos adereços, muito exigente e cheia de melindres. Usa um leque em forma de espelho, o abebé, no qual se mira constantemente. Seu dia é o sábado e gosta de galinhas amarelas, cabras, coquéns e omolocô, espécie de prato à base de feijão-fradinho. Seu culto é originário do povo ijexá.
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

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XANGÔ


XANGÔ
Titular da justiça, do fogo, do trovão e das pedreiras. Vaidoso e enfeitado, é marido de várias esposas. Prefere não lidar com os temas ligados à morte e distribui a justiça do alto de seu trono, um pilão emborcado. Muito cultuado, seu nome, em alguns Estados do Nordeste do Brasil, se confunde com o próprio candomblé. Seu dia é a quarta-feira. Suas cores são o vermelho e branco. Sua insígnia é uma machadinha com duas lâminas. Gosta de carneiro, cágado e amalá, espécie de caruru, feito à base de quiabos, temperado com dendê, cebola ralada, camarão seco e pimenta da costa. Gosta de se enfeitar, mas lança fogo pela boca, quando fala.
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé


Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

OSSÃE


OSSÃE
Senhor do segredo das folhas, habita nos lugares mais escondidos da selva. Exímio curador, reservado, silencioso, detesta falatório, alarido e confusão. Vê o mundo sem ser visto, através da ramagem das plantas, e quando se revela, mostra apenas uma banda sua. Sem ele, não há folhas e sem folhas, não há orixá. Antes de qualquer ritual nos terreiros, as folhas são selecionadas por espécie e por finalidade e utilizadas para banhos, defumações e sacudimentos. Ossãe recebe culto às quintas-feiras, suas cores são o verde em todas as variações, combinado com o rosa-claro. Sua insígnia é um fecho de sete varetas de ferro, presas a uma haste, tendo ao centro um pássaro estilizado. Recebe oferendas à base de milho, bodes e galos. Gosta de fumo de rolo, uma de suas principais oferendas.
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé  Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

OBALUAIÊ


OBALUAIÊ
Dono da Terra, temível guerreiro, a ele são dirigidos cultos de profundo respeito e reverência. Seu nome não pode ser pronunciado à toa. É o mesmo Omolu em sua personalidade jovem. Filho de Nanã, a mais velha das grandes-mães, Obaluaiê é defensor contra a peste e todas as doenças contagiosas. Está sempre coberto por um capuz de palha-da-costa, para que seu rosto nunca seja visto, ocultando as deformidades causadas por caranguejos, no seu tempo de criança. Seu dia é segunda-feira e suas cores são o preto e branco. Recebe galos, bodes e pipocas de milho-alho, recobertas com fatias de coco. Sua insígnia é o xaxará, espécie de cetro confeccionado com palitos de dendezeiro, palha-da-costa e búzios.
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

OMOLU


OMOLU
É o mesmo Obaluaiê em sua personalidade velha. É alquebrado e também só aparece coberto por um capuz de palha-da-costa. É o médico ferido dos pobres, de profundo pendor à caridade pública. É temido, respeitado e reverenciado em todos os terreiros de todas as origens, no Brasil. Tal qual Obaluaiê, seu culto é originário do jeje, assimilado pelos nagôs. Suas oferendas e dia de culto são os mesmos dedicados a Obaluaiê. Suas cores são vermelho, preto e branco, combinadas. Quando executa sua dança ritual, Omolu limpa as mazelas do mundo com oxaxará.
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

LOGUM-EDÉ


LOGUM-EDÉ
Filho de Oxum e Oxóssi, carrega os atributos de seus pais. Por isso mesmo, insígnias, cores, dias de culto e preferências de oferendas são duplas, isto é, as mesmas oferecidas a Oxum e a Oxóssi. Durante seis meses, reside na mata. Outros seis, nas águas doces. Metade dele é Oxossi; a outra metade é Oxum. Detesta as cores vermelho e marrom e carrega consigo muitas ojerizas e proibições. Considerado e tratado como um príncipe, é adolescente e cheio de vontades e delicadezas. Não suporta mandar, tem que se adivinhar o que ele deseja.
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IANSÃ


IANSÃ
Guerreira, destemida, senhora dos ventos, das tempestades, dos raios e da trovoada. É uma das esposas de Xangô. Comanda os astros e os eguns, isto é, os espíritos dos mortos. De temperamento tempestuoso, todos temem a sua ira. Veste-se de vermelho vivo e carrega uma espada com a qual guerreia e comanda os raios. Inquieta e dada a todo tipo de mudanças, ela é o próprio Fogo em sua feição feminina. Seus filhos lhe oferecem acarajé, abará, cabras e galinhas vermelhas. Odeia abóbora e jaca-mole. Seu dia é quarta-feira e é cultuada junto com Xangô.
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IBÊJI


IBÊJI
Filhos de Iansã, são gêmeos idênticos, tutelares da fartura e da abundância. Os devotos do candomblé lhes oferecem um farto banquete anual, cuja principal característica é a fartura e a variedade de alimentos da culinária afro-brasileira. Considerados como bênçãos divinas duplicadas, são crianças alegres, brincalhonas e fazedoras de milagres. São curadores, portadores da felicidade e do bem-estar geral. Suas cores são variadas. Normalmente, recebe culto em qualquer dia da semana, preferencialmente às quartas-feiras e aos sábados.
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

NANÃ


NANÃ

É a mais velha das grandes-mães, senhora da chuva e da lama, matéria primordial da criação. Ela varre as mazelas do mundo com o ibiri, seu cajado ritual. Considerada a avó dos humanos, ela é mãe de Omolu, de Obaluaiê e de Oxum-marê. Seu culto tem origem jeje, assimilado pelos nagôs. Seu dia é a terça-feira e suas cores o lilás ou o azul e branco. No seu ritual, não se usa ferramentas de metal. Recebe oferendas de patas, cabras e galinhas. Ela é a intérprete de Obaluaiê, porque ele só entende a fala dos humanos ao contrário. Por isso, seus devotos fazem pedidos a Nanã, para que ela, por sua vez, peça a Obaluaiê.


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Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

OXUM-MARÊ


OXUM-MARÊ
Orixá do arco-íris, pai da riqueza e preside o bom tempo. Seu culto é de origem jeje, assimilado pelo povo nagô e trazido para o Brasil. É ele quem circunda a Terra, sob forma de uma serpente encantada, para evitar a desintegração do planeta. Durante um tempo, ele é o arco-íris e está nas alturas. Num outro tempo, ele é a serpente encantada e se arrasta sobre a terra. Suas cores são as mesmas do arco-íris e recebe oferendas duplas, à base de milho branco e animais sacrificados como pombos, carneiros, galinhas, coquéns, tudo em casal. Dois dias são reservados a seu culto: as terças-feiras ou os sábados.
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé



Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

OXÓSSI


OXÓSSI
Senhor das matas, caçador por excelência, patrono da caça, da busca, da procura, da pesquisa. É o grande provedor, matador da “serpente encantada”. Destemido e resoluto, fiel e dono da carne, Oxóssi é o grande teimoso e conquistador. É proibido de comer mel e detesta cajarana. Seu dia é a quinta-feira. Suas cores são o verde, variando para o azul-turquesa, nas casas de origem ketu. Come galo avermelhado e milho cozido com fatias de coco. Gosta de todo tipo de caça. Suas insígnias são o arco-e-flecha e o eirukerê, espécie de espanador feito de rabo de boi, símbolo da realeza no candomblé.Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé


Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

OGUM


OGUM
Orixá guerreiro, patrono da agricultura, ferreiro e senhor dos caminhos. Irmão de Exu e Oxóssi, é solitário e mora nas matas. Ele ensinou aos humanos as técnicas da agricultura e como forjar ferramentas. Seu dia é terça-feira. Suas cores são o azul profundo, variando para o verde, nas casas de culto de origem ketu. Gosta de galo vermelho, inhame assado e regado com mel, feijão-preto, além de pipocas e farofa de azeite de dendê. Sua insígnia é uma penca de ferramentas em miniatura. É o senhor da guerra, da luta, da demanda e da peleja
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candomblé da Bahia" de Caribé

EXU


EXU
Mensageiro entre os humanos e os demais orixás. Sem Exu, nada se faz. Seus domínios são as encruzilhadas, onde ele está sempre pronto para levar recados e petições. Gosta de cachaça, farofa de azeite de dendê e de galo preto. Trocista, gozador e pregador de peças, seu gênio fez com que fiéis de outros credos imaginassem que ele é uma entidade demoníaca. Por conta disso, o culto aos orixá no Brasil também tem sofrido perseguições sem conta. Sua insígnia é o obé-fará, espécie de tridente de ferro. Suas cores são o vermelho e preto e o dia de seu culto é a segunda-feira
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Orixás

Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candmblé da Bahia" de Caribé O sistema de escravidão trouxe, para o Brasil, crianças, adolescentes, mulheres e homens africanos. O tráfico se estabeleceu desde os inícios da colonização portuguesa, até o século XIX. Os escravos foram trazidos à força das mais diversas partes da África, e a senzala serviu de caldeirão, onde se misturaram crenças, línguas e etnias africanas das mais diversas.

Os negros escravos, desde a senzala, tiveram na religião o espaço da resistência. Até mesmo em pleno vigor do regime escravocrata, um modelo de culto foi-se delineando, a partir de núcleos religiosos formados por negros libertos, de origem nagô. Com o tempo, esse modelo foi-se definindo, até tornar-se hegemônico e o culto aos orixás espalhou-se pelo Brasil.

Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candmblé da Bahia" de Caribé Os espaços construídos para o culto aos orixá obedeciam a um imaginário nagô, preservados a custo de lutas, sofrimentos e perseguições. As casas de culto terminaram por ficar conhecidas como terreiros e a prática religiosa, como candomblé.

Além da etnia nagô, grupos de outras origens se firmaram. Os nagôs, também chamados iorubas, no entanto, resistiram às diversas influências externas. Os usos e costumes preservados nos terreiros revelam a herança africana, que faz parte de um conjunto de traços de identidade do povo-de-santo nos candomblés do Brasil.

Os orixá, divindades africanas a quem se dirige o culto, também são tomados como arquétipos da personalidade humana, servindo de base para processos terapêuticos, entre os fiéis, adeptos e simpatizantes do candomblé, nos quartos de consulta e nos rituais de iniciação.

CALENDÁRIO LITÚRGICO E OBRIGAÇÕES RELIGIOSAS

CALENDÁRIO LITÚRGICO E OBRIGAÇÕES RELIGIOSAS

São cultuados no Ilê os orixás da tradição nagô no Brasil, sendo o culto a Oxalá de natureza cotidiana e perene. Além dos rituais públicos e privados para Oxalá, acontecem ainda festividades para Oxum e Oxóssi. A data mais solene do terreiro é a dos três rituais consecutivos para Oxalá, que ocorrem anualmente, no mês de janeiro: as Águas de Oxalá, a Procissão do Alá e o Pilão de Oxalá.

Os rituais para Oxum ocorrem anualmente, na época da lua cheia do mês de fevereiro e para Oxóssi, no mês de abril. As solenidades públicas para os demais orixás são realizadas de acordo com o calendário geral do Ilê.

Além de receber culto de modo cotidiano e regular, Oxalá, o Orixá Patrono do Terreiro, é sempre louvado às sextas-feiras, ao pôr do sol, no barracão das solenidades. Mensalmente, na primeira sexta-feira, a louvação a Oxalá acontece com oferta do ebô e acompanhamento da orquestra sagrada. No ritual do ebô de Oxalá, todas as pessoas presentes devem estar trajando vestimentas brancas.

É proibido o uso de outra cor que não seja o branco por parte de quem penetre no terreiro às sextas-feiras e durante as três festas consagradas a Oxalá, inclusive os visitantes. Em qualquer ocasião, não é permitido o uso da cor preta

ILÊ AXÉ IJEXÁ


CONTANDO A HISTÓRIA DO ILÊ AXÉ IJEXÁ
Imagens retiradas do livro "Os Deuses Africanos no Candmblé da Bahia" de Caribé Faz tempo. Faz muito tempo. Foi ainda no tempo do Engenho de Santana. Mejigã, africana do povo Ijexá, trazida à força para o Brasil, foi obrigada a ser escrava e tornar-se Inês Maria. Sacerdotisa de Oxum Abalô, Inês endureceu suas mãos na labuta diária do engenho. E os luxos da Oxum foram substituídos pela corrente, pela cafua, pela senzala. E somente mais tarde, quando a velhice não mais permitia que ela fosse aproveitada na lavoura, os seus senhores a abandonaram para que ela esperasse a morte.

Mas Inês trouxe um outro Destino: acreditar na Liberdade, sonhar com uma descendência sem as marcas do ferro da escravidão. Ainda na senzala, com Leocádio Figueiredo, um negro brasileiro de origem angolana, Inês gerou Maria Figueiredo, sua única filha, que nasceu de Ventre Livre. Era a esperança de sobrevivência do axé ijexá nas terras do Brasil, na Região do Cacau. E Inês Maria Mejigã se foi em avançada idade, com 115 anos, rodeada de bisnetos.

Depois de Mãe Inês, muitos foram os que vieram seguindo seus passos, para que o Ilê Axé Ijexá fosse fundado. Inês gerou Maria Figueredo que gerou Ulisses do Carmo que gerou muitos filhos e filhas, entre os quais Maria do Carmo. A família do Carmo tem como ancestral paterno, Manoel do Carmo, que viveu em Nazaré das Farinhas. Ele foi pai de Antônio do Carmo, que veio para Ilhéus e se casou com Maria Figueiredo. Na quinta geração, surge Ruy do Carmo Póvoas.

Um outro axé da mesma origem ijexá, veio do Sauípe para Ilhéus: Geralda de Peixe Marinho gerou Maria Gustavo de Jesus, Mãe Velha de Oxalá, que deixou para Ruy sua herança de axé. E ainda, um outro axé de ijexá juntou-se à herança de Mãe Inês: Flaviana de Oxum, ialorixá de Salvador, fez Emília de Xangô. Esta, por sua vez, fez Maria Natividade Conceição (Mãe Mariinha de Nazaré das Farinhas), que fez Ajalá Deré, Ruy do Carmo Póvoas, o fundador do Ilê Axé Ijexá.

Este terreiro tem como patrono Oxalá, o Pai da Criação e por isso mesmo é uma casa branca. Ele é o Rei da Paz e o Pai do Amor. Isso implica determinadas linhas de ação e compromissos da própria casa, que traz consigo as marcas da nação ijexá, que se distingue das demais pelo ritual, pelos toques, pelos cânticos e pelas danças.

A expressão Kabó ó! não reflete apenas um abrir de portas do Ijexá. É antes de tudo um convite à discussão de temas que reflitam o resgate e a preservação da cultura afro-descendente no Brasil, contribuindo para quebra de preconceitos.