quarta-feira, 15 de junho de 2011

Religião e Seriedade


     Ontem à noite eu estava debatendo alguns assuntos interessantes numa conferência por telefone, quando uma das pessoas disse:  “Religião é um assunto muito sério”.  Concordo que se encarem os fundamentos e procedimentos de uma religião como devem ser;  mas as pessoas tem confundido as coisas e passaram a acreditar que seriedade é algum tipo de postura que leva à respeitabilidade.  É a sociedade que causa essa confusão, e isso acontece em todos os segmentos da sociedade.
     Uma vez, lendo um artigo sobre as palestras de Osho, ele disse uma coisa muito interessante:

     “Se você encontra Jesus na cruz... com uma cara séria inglesa – algumas vezes me pergunto porque ele nasceu na Judéia. A Inglaterra era o lugar certo para ele; ele é inglês, sem tirar nem pôr. Ele nunca riu. E então, aquela cruz séria... e não apenas ele teve que carregá-la, ele diz a seus discípulos que todos deveriam carregar uma cruz sobre os ombros. Por que todos deveriam carregar sua cruz sobre os ombros ?  Por que não um violão ?”

     Fazer as coisas certas não tem nada a ver com seriedade.  Seriedade me parece mais como uma doença, uma falta de humor total.  E se você não tem senso de humor,  não poderá ter compreensão.  Eu nunca vi nenhuma estátua, pintura ou qualquer representação de santos, mestres ou divindades rindo.  Isso é por demais frio, distante, e a sensação que se tem é que isso se trata de um auto-controle qualquer,  e se você se policia e se controla dessa maneira não pode ser uma pessoa sincera, não existe calor humano, não existe conexão com o espírito, com o interior.  Isso parece mais alguma coisa mental, artificial.  Tornou-se um clichê afirmar que quanto mais consciente a pessoa se torna, mais séria ela fica, o que não representa a verdade em absoluto.
      Consciência é um estado de totalidade, e nele não há espaço para a seriedade auto controlada.  Esse tipo de seriedade mais se parece com a tristeza,  e acredito que essa tristeza se deva ao fato de que essas pessoas realmente não encontraram sua espiritualidade.  Consciência significa que a pessoa atingiu o pico, o cume,  e nesse caso como é que não há celebração, alegria e riso ?
     Algumas pessoas estão afirmando numa comunidade do Orkut que a auto-iniciação é válida porque a “Deusa” disse que “se você não encontrar o que procura dentro de você, não encontrará fora de você”,  e um wicano tradicional comentou por lá que essas palavras não são da Deusa, mas foram escritas por Doreen Valiente.  Novamente interpretações erradas, totalmente erradas de textos tradicionais.  É impossível interpretar esses textos pelo lado de fora, sem vivência e nem treinamento dentro da Tradição.  Eu percebo que essas tentativas de justificar o injustificável se devam, claro, a armadilhas do ego.  Essas pessoas se sentem ordinárias, comuns, mas querem ser extraordinárias, incomuns.  Na verdade os Deuses nunca criaram nada ordinário, mas essas pessoas usam isso como alimento egoísta.  Ninguém tem coisa alguma a ver com esse problema,  porque tudo o que é extraordinário se torna incomum por causa dos Deuses,  porque tudo o que existe veio do Todo, permanece enraizado no Todo, para em seguida se dissolver no Todo.
     É um ranço cristão acreditar que somos ou nascemos pecadores e miseráveis e portanto precisamos tornar-nos extraordinários. Porém isso é uma tremenda armadilha do ego, a não ser que você tenha realmente tido uma experiência espiritual e tenha vivenciado a divindade.  Ou seja,  tenha se tornado consciente.
     Wica é uma das únicas religiões que eu conheço aonde essa seriedade social, mundana, não tem sentido.  Wica é celebração, e é por isso que a energia pode fluir livremente.  Não existem barreiras para a felicidade, a não ser aquelas que você mesmo colocou lá.  A vida não é uma prova com barreiras, nela não existem condições a serem satisfeitas para ser feliz.  Isso é uma insanidade.  Mas a maioria das religiões organizadas dizem:  “Primeiro faça isso e aquilo, e então você poderá celebrar, poderá ser feliz.”  A sua felicidade é condicionada, e essa grande mentira tem causado muitos males.
     Trata-se do velho estratagema – e puxa vida !,  isso já devia ter sido desmascarado há muito tempo – de fazer com que as pessoas se sintam ordinárias, inferiores e então acenar-lhes com a salvação, criando o desejo de que se tornem superiores.  Primeiro criam a culpa, a condenação, e então acenam com um caminho miraculoso.
     Toda a dificuldade em seguir o sacerdócio wicano é este.  As pessoas se “convertem” à Wica pensando que nela poderão utilizar os mesmos velhos métodos.  Isso cria muita dificuldade, e quando toda essa gente percebe que tais métodos não funcionam aqui, começam a deturpar a religião para que a antiga neurose possa ser colocada em ação.
     Realização espiritual é uma coisa que independe de tempo.  Você pode ser realizado, feliz, pleno, exatamente agora, se quiser.
     Hoje recebi um e-mail cujo título:  “Você é feliz?”  me chamou a atenção:

     “Durante um seminário para casais, perguntaram à esposa:
     - Seu marido lhe faz feliz? Ele lhe faz feliz de verdade ?
     Nesse momento, o marido levantou o pescoço, demonstrando segurança. Ele sabia que sua esposa diria que sim, pois ela jamais havia reclamado de algo durante o casamento. Todavia, sua esposa lhe respondeu com um  “Não”, bem redondo...
     - Não, não me faz feliz.
     Nesse momento, o marido já procurava a porta de saída mais próxima quando veio a conclusão da resposta.
     - Ele não me faz feliz... Eu sou feliz. O fato de eu ser feliz ou não, não depende dele e sim de mim. Eu sou a única pessoa da qual depende a minha felicidade. Eu determino ser feliz em cada situação e em cada momento da minha vida, pois se a minha felicidade dependesse de alguma pessoa, coisa ou circunstância, sobre a face da terra, eu estaria com sérios problemas. Tudo o que existe nesta vida muda constantemente... O ser humano, as riquezas, meu corpo, o clima, meu chefe, os prazeres, etc. E assim poderia citar uma lista interminável. Às demais coisas eu chamo  ‘experiências’, esqueço-me das experiências passageiras e vivo as que são eternas: amar, ajudar, compreender, aceitar, perdoar, consolar. Lembro-me de viver de modo eterno. Talvez seja por isso que quando alguém me faz perguntas como esta, gosto de responder com apenas uma frase, como se esta fosse a conclusão de todo o seminário, como se fosse a chave de toda a felicidade, de todo casamento e de toda a vida humana; gosto de responder com aquela velha e famosa frase que ainda não conseguimos compreender:  ‘A felicidade está centrada em mim.’    

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