quarta-feira, 15 de junho de 2011

O que é Seguir O caminho espiritual?


Existe um ditado oriental que diz:   “No começo as montanhas são só montanhas e os rios apenas rios;  ao entrarmos no caminho espiritual as montanhas não são mais montanhas e nem os rios são apenas rios;  quando despertamos no caminho espiritual, as montanhas são novamente montanhas e os rios apenas rios”.   Esse ditado é bastante interessante, ainda mais que como buscadores espirituais, estamos tentando nos tornar diferentes, excepcionais. Essa é a expectativa da mente ordinária: tornar-se extraordinária.  O comum sempre se sente inferior e desse modo, a partir desse complexo de inferioridade, busca tornar-se especial.  Só que quem é especial não precisa fazer coisa alguma para ser especial,  não existe nenhum complexo nele.  Aquele que é,  está sempre pronto para relaxar no que é comum.

Eu nunca conheci nenhum sacerdote, nenhum mestre que não fosse uma pessoa comum.  Agora as montanhas e rios são outra vez apenas o que são. Mas as pessoas comuns estão sempre lutando para serem extraordinárias e isso é como que uma obsessão,  a obsessão por um objetivo novo – a religião que trará a salvação.  Elas crêem que a religião as tornará felizes,  que um novo tipo de paraíso será instaurado em suas vidas,  que toda dor e sofrimento desaparecerá num passe de mágica unicamente porque se tornaram buscadores.  O paraíso está somente na imaginação dos que orientam sua vida por objetivos. Essas pessoas não são religiosas,  são apenas  egoístas embarcando numa nova viagem  do ego, rumo à felicidade suprema.

O paraíso idealizado por essa gente está sempre no amanhã, no futuro. Porém o verdadeiro paraíso está aqui,  e agora.  E isso nada tem a ver com religião, e nem mesmo com espiritualidade porque transcende tanto a religião como a espiritualidade. Trata-se de adentrar numa nova visão de mundo e de si próprio,  na sensibilidade e na consciência,  na observação e na meditação.  É apenas essa a diferença entre a pessoa comum e o sacerdote.  Uma diferença de qualidade.

No entanto, as pessoas comuns estão competindo todo o tempo umas com as outras.  Mesmo no terreno da religião estão competindo.  Isso é pura ambição. As crianças são “educadas” para a competição, para a luta.  Toda noção de vida ocidental está voltada para a guerra,  e os melhores são sempre os mais fortes, os mais astutos, os mais desonestos.  Quem se importa com os meios ?   E a vida religiosa dessas pessoas é uma desonestidade.  Todo o sistema é em si mesmo neurótico,  e  o  mais famoso é aquele que lidera a neurose, o mais neurótico.  Nesse sistema existe apenas ansiedade, angústia, loucura.  Essas pessoas não conseguem enxergar coisa alguma verdadeira,  estão cegas,  embriagadas pelo sistema,  loucas tentando manter suas máscaras de serenidade enquanto manipulam a realidade e tentam mostrar aos outros que não são pessoas comuns.  Todo o esforço para se tornar extraordinário é o esforço para se tornar insano,  louco.

Todo o problema humano resume-se num simples ponto:   a mente humana é o problema.  Tudo o que foi ensinado, as pessoas continuam repetindo indefinidamente e tudo o que disseram, as pessoas continuam dizendo, geração após geração,  mecanicamente.   Entrar no caminho espiritual é começar a perceber que ficar repetindo as neuroses que foram ensinadas e condicionadas na mente é continuar transferindo a velha doença.  Na verdade a compreensão surge do silêncio.  O problema é mergulhar no silêncio,  é despedaçar a velha mente e sua loucura.

Todo mundo sabe que os filósofos e eruditos geralmente se comportam de maneira estúpida.  Essas pessoas estão mergulhadas no barulho mental. São ótimos para falar sobre o que sabem,  mas se alguma situação se apresenta,  bem isso só mostrará como são tolos.  Uma estória:

Um rapaz vinha dirigindo seu conversível vermelho novinho por uma estrada, quando numa curva passou por um carro desgovernado, dirigido por uma mulher.  Ao passar por ele, a mulher gritou pela janela do carro:  “Porco !”  O rapaz imediatamente gritou em resposta:  “Vaca !”  Satisfeito por ter dado o troco, ele faz a curva em velocidade,  e.....  atropelou um enorme porco no meio da estrada.

Toda situação, por menor que seja, na qual a informação do erudito não se adequar só mostrará sua estupidez.  Tem muita gente que passa a vida discutindo, argumentando, contra-argumentando,  conquistando.....  mas essas pessoas não são religiosas.  São somente acadêmicos posando de religiosos.  Religião não admite argumentação.  Religião é o que é.  Essas pessoas usam a retórica como uma arma,  mas a única coisa que conseguem é permanecer na ignorância.  Na Wica isso acontece muito entre iniciados e não iniciados.  Os leigos continuam discutindo, argumentando com os iniciados.  Eles mudaram os fundamentos da religião para atender às suas exigências particulares e pessoais, porque a mente dessa gente continua repetindo a loucura.  Eles não conseguiram relaxar no que é simples,  eles não conseguiram entrar no silêncio e para eles só existe argumentação.  Se você discute com um iniciado, você perderá o ponto,  porque sua mente estará repetindo a velha neurose, tentando ser mais do que o mestre.  O iniciado não está interessado em ser mais do que ninguém,  ele está apenas mostrando o caminho certo,  nada mais.
Existe uma estória budista que ilustra isso muito bem:

Existia na Índia um erudito chamado Maulingaputra.  Esse homem percorria o país debatendo com outros filósofos e derrotando todos.  Na época das monções,  Buda havia ficado retido numa aldeia por 4 meses, quando esse erudito foi vê-lo.  Quando ele chegou,  Buda olhou para ele e riu.  O erudito ficou ofendido e disse:  “Por que você está rindo ?”  O Buda respondeu: “Estou rindo porque neste lugar existe um homem que fica sentado diante de sua casa contando os touros e as vacas que vão ao rio beber água.  Fiquei intrigado com isso,  com o fato dele ficar todos os dias sentado, contando os animais, e então perguntei:  “Por que esse interesse todo ?  Esses animais lhe pertencem ?”   O homem respondeu:  “Não eles não me pertencem, nenhum deles.  Sou muito pobre e não tenho nenhuma vaca.”. Buda disse ao erudito: “Vendo você chegar, me lembrei daquele homem.”. O erudito perguntou: “Mas como eu estou relacionado com esse homem ?  Que loucura é essa ?”.  O Buda respondeu:  “Me lembrei daquele homem porque, seja o que for que você saiba, não lhe pertence. São vacas alheias.  Eu posso ver sua cabeça cheia de coisas de todo tipo, lindos  e sábios dizeres.  Eles lhe dão a aparência de sábio,  mas me diga uma coisa:  você sabe ou está apenas repetindo as escrituras ?”

Isso é muito pertinente.  Isso deveria ser considerado.  Porque é exatamente essa a diferença entre um iniciado e um auto-iniciado.  O auto-iniciado está somente repetindo o que os outros disseram.  Está só contando vacas alheias. Nenhum deles teve uma experiência espiritual legítima,  real.  Mas continuam esperando pela revelação da Deusa, porque  “Ela tem um plano para eles.”  E assim, essas pessoas continuam sendo astutas com os outros,  mas somente conseguem enganar aos outros e a si mesmos.  Todo o problema é esse:  se você engana aos outros,  vai começar a enganar a si mesmo.  Você acaba acreditando na própria mentira.  Essas pessoas perderam o contato com a sinceridade, com a verdade.  E mentiram durante tanto tempo que agora só sabem mentir.

É a velha ambição.  Essas pessoas querem ser sacerdotes,  mas entrando pela janela.  Só que a grande questão existencial é muito diferente.  A grande questão não é saber se você encontrou a Deusa,  se você encontrou o sacerdócio.  A grande questão é  “Você se encontrou?”   Ou então  “Quem sou eu?”  E essa questão só pode ser respondida no silêncio.  Nunca no tumulto da ambição de vir a ser alguma coisa, e muito menos de vir a ser alguma coisa por meios desonestos,  por meio da violência.   Sim, porque tentar quebrar o portão do sacerdócio e entrar por ele sem a atitude correta é pura violência.  É por isso que existem os mestres,  os sacerdotes.  Esse é o seu trabalho.  Ele não dirá e nem pode dizer o que sabe, mas ele certamente criará um modo pelo qual você possa florescer.

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